O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.851, relatada pela ministra Cármen Lúcia, que questiona a constitucionalidade da Lei baiana nº 12.352, de 2011.
Proposta pelo procurador-geral da República (PGR), a ação contesta a possibilidade de servidores investidos em serventias oficializadas optarem pela migração para a prestação de serviços notariais e registrais em regime privado.
Segundo Dirley da Cunha Júnior, em um artigo publicado na revista eletrônica Consultor Jurídico (disponível em Conjur), a polêmica reside no fato de que a lei assegura a esses servidores o direito de migrar para o regime privado por meio de delegação, sem novo concurso público, o que, segundo o PGR, afronta o artigo 236, § 3º, da Constituição de 1988, que exige concurso de provas e títulos para o ingresso na atividade notarial e registral.
Os Pilares do Debate Jurídico
Para Dirley da Cunha Júnior, a discussão está centrada nos seguintes argumentos fáticos e jurídicos:
- Ausência de Concursos para Delegatários: O Estado da Bahia nunca realizou concurso para delegação privada dos serviços notariais e registrais.
- Concursos Anteriores: Em 2004, o Tribunal de Justiça da Bahia realizou concurso para prover cargos como Oficial de Registro de Imóveis e Tabelião de Notas.
- Servidores Investidos: Esses servidores foram aprovados em concurso de provas e pertencem ao quadro do Tribunal de Justiça da Bahia, ocupando cargos equivalentes ao de Analista Judiciário.
- Privatização e Direito de Migração: A lei questionada extinguiu os cargos oficializados e permitiu que os servidores optassem pela delegação privada.
Argumentos em Defesa da Constitucionalidade
Os defensores da Lei nº 12.352/2011 argumentam que a privatização respeitou os direitos constitucionais dos servidores, com base no artigo 32 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que assegura direitos àqueles investidos em serventias oficializadas antes de 1988.
A Constituição Federal, ao prever a execução dos serviços notariais e registrais em regime privado, também resguardou, excepcionalmente, os direitos dos servidores das serventias oficializadas. Para muitos juristas, excluir esses servidores seria uma afronta à segurança jurídica e à proteção da confiança.
Jurisprudência e Dilemas Interpretativos
O STF possui um histórico de anulação de normas estaduais que asseguram a ascensão de servidores por promoção sem concurso público, conforme demonstrado em diversas ADIs (como as ADIs 126-RO e 552-RJ). No entanto, a situação da Bahia difere, pois os servidores cumpriram o requisito do concurso público para os cargos oficializados antes da privatização.
Outro ponto relevante é o prazo para revisão de atos administrativos. De acordo com a Lei Federal nº 9.784/99, a administração pública tem até cinco anos para anular atos com efeitos favoráveis aos destinatários, salvo má-fé comprovada.
Reflexões
A decisão do STF será um marco na definição do equilíbrio entre a exigência do concurso público específico e a proteção dos direitos adquiridos. Se a ADI for considerada procedente, muitos servidores poderão ser prejudicados, levantando questões sobre o papel do Estado na preservação da segurança jurídica.
Perguntas para Reflexão
- Até que ponto a segurança jurídica pode se sobrepor à exigência de um concurso público específico amplo e irrestrito?
- Você acredita que a privatização dos cartórios traz mais eficiência ao serviço ou apenas transfere responsabilidades do Estado para a iniciativa privada?
- Como o respeito à proteção da confiança pode impactar outros setores da administração pública?
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