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Comissão Arns cobra providências para solucionar crimes no campo


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A Comissão Arns reuniu-se nesta quinta-feira (20), em Belém, com autoridades paraenses para debater casos de violência no campo contra trabalhadores sem terra, populações tradicionais e povos indígenas. A iniciativa, que visa cobrar providências para solucionar crimes na região, fez parte de uma caravana que percorreu diversas localidades afetadas pela violência, como Altamira, Anapu (onde foi assassinada a missionária Dorothy Stang), Eldorado do Carajás (onde 21 sem-terra foram mortos em um massacre em 1996) e Marabá.

Participaram da reunião de hoje, além de integrantes da Comissão Arns, o secretário de Segurança Pública do Pará, Ualame Machado; o procurador estadual de Justiça, Cesar Nader Mattar, o secretário de Direitos Humanos, Jarbas Vasconcelos, e outros representantes do governo. Na ocasião, ficou acordado com a comissão encaminhará para as autoridades um documento com os relatos recebidos.

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“Isso é para que se evite a repetição de episódios como os de Bruno Pereira e Dom Philips, [mortos no ano passado no Amazonas], de Doroty Stang ou de Eldorado dos Carajás. Esse relatório vai ajudar a colher informações para que os órgãos exerçam papel de combate e defesa da vida”, disse Paulo Vannuchi, ex-ministro dos Direitos Humanos e integrante da comissão.

Desde o dia 15 de abril, a caravana da Comissão Arns percorreu diversas localidades para colher relatos de violências. Nos últimos anos, o Pará se tornou o estado brasileiro com o maior número de mortes em conflitos agrários: foram 111 assassinatos entre 2019 e 2022, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Nesse período, a comissão recebeu dezenas de pedidos de socorro e decidiu viajar aos locais para “dar voz a pessoas que não têm voz”. A iniciativa, segundo Vannuchi, teve que ser adiada para este ano, devido à falta de condições de segurança e ao clima de hostilidade durante o governo passado.

“Pudemos percorrer Marabá, Eldorado do Carajás, Anapu, Altamira colhendo dezenas, talvez centenas de depoimentos contundentes, muitos deles ouvidos com lágrimas. Muitos não foram documentados devido a ameaças a essas pessoas”, resumiu Vannuchi. O ex-ministro informou que os relatos estão sendo encaminhado para a Ouvidora Agrária Nacional.

Entre os relatos recebidos pela comissão está o do assassinato de líderes e ameaças a um acampamento de trabalhadores rurais que ocuparam área grilada por fazendeiros de Pau D’Arco. Em 2017, depois de uma reintegração de posse a favor da Fazenda Santa Lúcia – mesmo sendo a fazenda fruto de grilagem –, 25 famílias de trabalhadores rurais voltaram a acampar na área.

De acordo com testemunhas, policiais militares cometeram uma chacina que vitimou nove homens e uma mulher. Dezesseis pessoas foram indiciadas pelo massacre e devem passar por julgamento no Tribunal do Júri, ainda sem previsão.

“Quarenta dias após a chacina, Rosenildo Pereira coordenador da Liga dos Camponeses Pobres, também foi executado quando saía da igreja em Rio Maria, próximo de Xinguara. O caso sequer tem inquérito aberto. Quatro anos depois, a testemunha-chave do episódio, Fernando dos Santos Araújo, foi morta com um tiro na cabeça no acampamento Jane Júlia, na mesma região do crime original. O crime também segue sem respostas das autoridades”, diz a comissão.

Outro relato é o da ameaça de pistoleiros a uma comunidade em São Félix do Xingu, município marcado pelo assassinato de Zé do Lago e sua família, em 2022. Até o momento, nenhum responsável pelo crime foi condenado, e a investigação está parada há um ano e três meses.

Na região, somente de 2011 a 2016, seis trabalhadores rurais foram assassinados. Em 2021, um fazendeiro da região fez novas ameaças e foi proibido de voltar à área, por medida cautelar. Em 2022, mais de 20 caminhonetes da associação de fazendeiros, com homens armados, invadiram a comunidade e intimidaram e agrediram moradores. Neste ano, uma pessoa foi assassinada no domingo de Páscoa. Apesar de haver inquérito aberto, ninguém foi preso.

Na segunda-feira (17), a delegação da Comissão Arns recebeu os relatos do povo indígena Parakanã. As 28 aldeias estão localizadas entre os municípios de Nova Repartição e Itupiranga e somam mais de 1.500 habitantes. Há um ano, três jovens não indígenas foram encontrados mortos dentro do território e, conforme a comissão, desde então, moradores de Nova Repartição, município onde os rapazes moravam, vêm acusando e hostilizando os indígenas, com ameaças de violência física e até de morte.

A delegação da Comissão Arns também conversou com moradores e líderes dos acampamentos Hugo Chávez, em Marabá; Dalcídio Jurandir, em Eldorado do Carajás, e Eduardo Galeano, em Canaã do Carajás, todos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). De acordo com a comissão, no acampamento Eduardo Galeano, 110 famílias de trabalhadores rurais convivem com atividades ilegais de garimpo de ouro e cobre e são frequentemente ameaçados de morte.

De acordo com a comissão, o histórico de crimes na região, porém, remonta a mais de duas décadas, com o exemplo emblemático do massacre de Eldorado do Carajás, em 1996, quando 155 policiais militares (PMs) assassinaram 21 trabalhadores rurais que faziam uma marcha pacífica em direção a Belém. De todos os PMs, apenas dois foram condenados: Mário Pantoja e José Maria de Oliveira, mandantes do crime.

Durante a caravana, membros da comissão participaram de um ato no Acampamento Pedagógico da Juventude Oziel Alves, em Eldorado do Carajás, para homenagear os trabalhadores assassinados. No local, a delegação conheceu o Memorial do Massacre dos Sem Terras, onde há uma cruz de madeira que simboliza o crime e uma placa com os nomes de todos os mortos.

No dia seguinte, a comissão visitou a cidade de Anapu, para conhecer o Assentamento Irmã Dorothy Stang. O local, oficializado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no ano passado, ocupa a área onde a missionária norte-americana Dorothy Stang foi baleada e morta em 2005 a mando de fazendeiros. A vítima é referência na luta pelo assentamento de trabalhadores rurais.

Criada em fevereiro de 2019, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns busca dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humanas, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas – como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTQIA+, mulheres, jovens e moradores de comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza.

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